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Foto do escritorMaria do Mar Vieira

Autismo Leve: Será mesmo leve?


Foto de Carlos Gomes

Diariamente ouço a frase: ‘Ah mas o teu autismo é leve, não é tão mau.’ Eu esboço um sorriso e aceno com a cabeça. Não digo nada para não me irritar, apenas ignoro. Mas está na altura de parar de ignorar.

Primeiro vamos parar de fazer essa distinção entre autismo leve e autismo severo. Sou Autista. Ponto. O Autismo é um espectro. Todos temos as nossas dificuldades e capacidades. O problema é que as nossas dificuldades são desvalorizadas. Posso conseguir disfarçar mais as minhas características, mas não deixo de ser autista. O meu autismo é válido tal com o autismo de todos. Posso mascarar, imitar o comportamento das pessoas à minha volta, reprimir estereotipias à frente das outras pessoas, posso aguentar o barulho até certo ponto sem ninguém dar conta, posso fingir que sou neurotípica e posso ser vista como tal, mas não deixo de ser menos autista por isso.


O que podes não saber é que depois de ter estado contigo e com os nossos amigos naquele café, eu cheguei a casa exausta e a única coisa que consegui fazer foi ficar deitada na cama sem tolerar nenhum estímulo. Quando passou aquela mota, o barulho ressoou na minha cabeça dez vezes mais alto e ficou uma pressão na minha cabeça durante bastante tempo. Posso passar noites sem dormir a pensar no meltdown que não consegui controlar. Posso passar dias a pensar repetidamente no mesmo assunto. Posso-me controlar para não fazer estereotipias, mas mal estou sozinha, os meus braços mexem-se sozinhos e que alívio que é. Posso ter uma crise de ansiedade apenas porque não correu como tinha previsto na minha cabeça. Quando preparo um diálogo na minha cabeça porque não sei como falar naquela situação e a outra pessoa não diz o que tinha planeado. Quando tenho de fingir que te olho nos olhos para me achares normal. Quando dizem que sou insensível, mas estou a sentir tanto que não sei como dizer isso. Quando a ansiedade cresce, não só quando tenho de fazer algo novo, mas também quando o autocarro está a chegar e eu sei que tenho senhas suficientes e mesmo assim acho que a máquina vai dar sinal vermelho e quando a minha paragem se aproxima e fico paralisada a pensar que vão todos olhar para mim quando sair. Quando o telefone toca e o meu coração dispara a mil. Quando não sei como interagir e fico apenas calada a olhar para vocês. Quando entro num local com muitas pessoas e a minha cabeça fica sobrecarregada ao ponto de só querer gritar e sair dali, mas não posso e aguento. Quando fico uma hora a repetir a mesma palavra ou frase na minha cabeça. Quando me perguntam o que se passa e eu não sei o que estou a sentir. Quando me tocam e o toque dói. Quando quero falar e não sai nenhuma palavra da minha boca. Quando absorvo mil e um estímulos, fico exausta e quando digo que estou cansada me dizem que não fiz nada o dia todo. Quando quero ser eu própria, mas não posso para ser aceite.


E agora, ainda achas que é leve?


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